A globalização e a livre circulação de pessoas e bens

“Um rico quando come não pode e nem deve limpar os beiços, porque deve deixar que as migalhas caiam para os pobres se refastelarem.”

Ora viva, Quim!

Em pleno dia do meu aniversário (9 de Janeiro), entre outros destinatários, escrevo também para ti. Integraste uma não pequena lista dos meus amigos, que omiti, creio que, no teu caso, por mero lapso, a menção no texto celebrativo do meu sexagésimo aniversário natalício no pretérito ano de 2021. Mas, reconheço ter sido bom omitir o teu nome, porque sei que não gostas de aparecer. Infelizmente, contra a tua vontade e sem te consultar, hoje te refiro. Vou te poupar, ainda assim, de menção integral, para não ficares à disposição de meus eventuais detractores. Tu sabes, melhor do que eu, que nem todos os que nos mostram dentes à farta estão connosco. Pode ser uma forma de não estar connosco. E os que não nos mostram estarem connosco. E ficarmos com a perspectiva trocada. Há quem abana a cabeça de baixo para cima para concordar. Mas, há quem fá-lo para discordar. Há quem abana a cabeça da esquerda para direita e vice-versa para não concordar. E há quem o faz para concordar. São os retratos que a vida nos oferece. O importante é que tu e eu estamos concordantes em muitas coisas. Acordamos em não concordar em política, religião e desporto. Não concordar também é concordar! Mas, o pacto de não falarmos do desporto já o quebrámos há vários anos. E fui eu o motivador disso. Porque, de cada vez que o nosso clube comum perdia, eu ligava-te para barafustar. Aliás, aplicamos essa máxima para os outros, porque entre nós já quebramos tudo. Também nem tanto, não é? Tudo aos extremos não faz sentido. Com mais vinho ou menos vinho, tudo se quebra.Temos uma certa queda pelo futebol, perdemos horas e horas a assistir pessoas a correr atrás de uma bola. E ficamos tristes quando a nossa equipa perde, mais do que os próprios jogadores que auferem fortunas à custa disso. À custa de chutos e pontapés. Mas, lá diz o ditado, não é só de pão que o Homem vive, também do circo.

Trago-te hoje, a propósito da globalização e da livre circulação de pessoas e bens, algo que valha a pena para uma reflexão adulta. O pior de tudo é pensar pequeno. Mas, há que pensar grande, porque nós somos adultos, na verdade. Se o mundo é uma aldeia global, dominada pela liberdade do mercado, porque hoje aparecem restrições, à fita métrica?

Trago-te hoje uma reflexão, a propósito do banimento dos voos da Europa para uma parte da Região Austral de África, nomeadamente, Moçambique, Botswana, África do Sul, Zimbabwe, Namíbia, e Malawi, bem assim, os reinos do Lesotho e da Swazilândia (o dito E-Swatini). Nós, os desta Região, que tínhamos poucos casos de covid-19, à data do banimento, entretanto, fomos punidos, com o cancelamento de voos da Europa e dos EUA.[1] Se calhar é mesmo ou tivesse sido mesmo melhor que esses voos não existam ou não existissem, para que não sejam vocês a trazer-nos os problemas, ou a agravar os nossos já existentes. Que não são poucos. Não estou contra a regulação dos voos, nem a sua redução neste período da pandemia. Estou contra a escolha específica de uma zona do globo terrestre para excluí-la do convívio global, sabido que não foi esta região a primeira a ter o famoso omicron. A região apenas constatou o óbvio, que divulgou ao mundo, tal como a OMS o impõe. Em respeito às regras de jogo. Regras do Direito Internacional, comummente, aceites por todos.

De todo o modo, não gostei da piada! Tem sido por estas alturas em que os voos estavam cancelados que costumas enviar-me o bacalhau, azeite do melhor, vinho da melhor colheita ou vários outros produtos da última safra. Tem sido por estas alturas que me envias o bolo-rei, ainda que eu prefira o bolo-rainha, que dizes não existir. Tem sido por estas alturas que trocamos presentes típicos de cada um dos lados. Na verdade, trata-se de uma troca desigual, em que o meu retorno é apenas o de um obrigado, contra tanta encomenda. Mas, não deixa de ser troca de simpatias e de amizade, com promessas de galinha à cafreal e castanha de caju à maneira quando cá aterras. Se fosses adepto fanático de piripiri ainda te encharcava com os achares da Dona Rachida, uma proeminente produtora da minha zona, que com um melhor rótulo se internacionalizaria. Mas, comes o piri piri de forma moderada como qualquer um. Apenas um pouco mais que eu. Para a minha sorte, ainda tenho alguns vinhos antigos, das tuas remessas. Alguns destes vinhos quando vieram tinham cinco anos. Com o tempo já têm quinze ou vinte anos. Tu mesmo costumas dizer que o vinho é tanto melhor quanto mais tempo tiver. Então, eu tratei de guardá-lo para apimentar o sabor pela longevidade. Até do whisky que tenho, vou guardando para ter tantos anos. Se não teve tanto tempo na pipa encarrego-me eu de lho dar.

O mundo está à deriva e os países fracos são hostilizados e estigmatizados como se fossem eles os mentores da pandemia. Esta pandemia exige uma luta global e permanente. Teremos de passar a vida a nos vacinarmos anualmente, para combater esta pandemia, e isso, não se compadece com o jogo de atira culpas. Olha que fiquei prejudicado, porque tive que cancelar as minhas deslocações de pesquisa para aí. Compreende-se, entre as pesquisas e a vida, só um tolo faria pior escolha. Eu como ainda tenho tudo no lugar não cometo essa loucura. Mas, as ligações aéreas reguladas e com testagem e cumprimento das medidas sanitárias nunca poderiam ter sido interrompidas para um região localizada, especialmente. A minha região. A Região Austral de África.

O mundo é uma aldeia global. Assim, trata-se de levar a aldeia ao mundo e de trazer o mundo à aldeia. Isso não se opera sem a livre circulação de pessoas e bens. Dos bens estamos a falar de mercadorias e as mais nobres são o know how (o conhecimento) e os capitais. É claro que o Homem, além de ser pessoa, é também o bem mais sagrado que a terra tem. É um bem precioso e raro. Hoje não se pode falar da nobreza da circulação do conhecimento e das tecnologias sem o seu mentor que é o Homem. Quando indico Homem, com maiúscula inicial, refiro-me ao homem e à mulher. Sabe-se que há homens que recusam sê-lo e há mulheres que também preferem ser homens. Mas, não é disso que estamos a falar. Estamos a falar das criaturas tal como concebidas e criadas por Deus, de quem todos nós viemos e a ele voltaremos. De alma e em pó.

É nobre falar da circulação de cérebros do saber, da circulação dos capitais e dos diversos produtos alimentares e farmacêuticos. E não podemos conceber o mundo ao nível de provincianismo. Ou mesmo do distritalismo, já que vocês não têm províncias. E nós não podemos pretender ser provincianos. Um conceituado treinador de futebol cá do sítio, que ganhou títulos pelos três grandes de Maputo (Costa do Sol, Ferroviário, Maxaquene), Arnaldo Salvado dizia, certa vez, em resposta aos seus detractores, que se gabavam de melhores treinadores do mundo, e citando-o de memória, que alguns tinham o seu mundo geográfico situado entre a Baixa da Cidade de Maputo e Magoanine, num troço de menos de dez quilómetros. Esse é o mundo de certas pessoas. Algumas pessoas pensam global e agem na aldeia. Há quem quer parar o vento da história com as mãos. Ou em linguagem bem conhecida, tapar o sol com a peneira. Isso tudo dá a mesma coisa.

Há que pensar e agir grande. Não fosse assim, o saudoso Presidente Samora Machel, não teria enviado jovens em massa para estudar no exterior, outros para a docência cá no burgo, outros ainda, para formação militar (aviação), no exterior, interrompendo assim vários cursos, no célebre discurso de 8 de Março de 1977. Hoje, celebramos Samora, entre outros, por esse feito também – visão estratégica e utopia. Estou a falar de uma visão de gigante, para não falar de visão de águia.

Sem o pensar grande das várias gerações, o colonialismo e o Apartheid não teriam sido eliminados. Não podemos fazer tudo ao improviso e esperar pela sorte do acaso, nem podemos ficar na inacção ou na omissão e esperarmos resultados positivos pela simples graça e bênção Divina, porque não pretendamos pedir a Deus que premie os inúteis (useless).

O perigoso neste mundo global é cada pessoa pensar que é insignificante para dar qualquer contributo e fixar-se na resignação e no conformismo. Ou os mais significativos influenciadores das sociedades pensarem que são importantes por demais, para não acolherem o contributo de quem nada é. Enganam-se. Reza a história, que Eduardo Mondlane, dos mais conceituados académicos do movimento libertador em Moçambique, ouvia os que sabiam, ouvia os sabiam pouco e ouvia os que nada sabiam, e, nem por isso, deixava de ser grande. Aliás, Jesus Cristo, filho unigénito de Deus, não alinhou pela mania das grandezas e deixou-se baptizar por João Baptista (Mateus, 3:16-17; João, 1:33-36).

Escrevi noutro dia, um texto longo, denominado: A criminalidade global e a insegurança local: o caso moçambicano. Foi objecto de escrutínio no Colóquio Internacional sobre a Justiça no Século XXI, promovido pelo Prof. Doutor Boaventura de Sousa Santos[2], em Coimbra. Eu chamava a atenção para a extensão da criminalidade à largura do mundo, que parte de bolsas localizadas e espalha-se e também chamava a atenção que se devia ter face ao fenómeno: crime organizado. Mas, chamava a atenção ao fenómeno de tráfico de pessoas, de armas e de droga; branqueamento de capitais, aliados fundamentais senão naturais do terrorismo. Embora o artigo tenha tido impacto internacional relevante, cá no burgo, os poucos que o leram se o tiverem lido mesmo, não tiraram ilações das entrelinhas. Ou não conseguiram ou não tiveram como compreendê-lo. O seu alcance. Para sermos justos, e à sua maneira, nem tanto cínica nem menos, a Stv, por via dos jornalistas, Jeremias Langa e Boaventura Mucipo, meia volta, iam referindo, em ar jornalístico, ainda que forma desafiante e questionadora, como aqueles se caracterizam. Com as tecnologias de informação e comunicação, o mundo de hoje é uma aldeia virtual. Não há paredes nem fronteiras físicas para impedir a acção do mundo virtual. Da mesma forma que os espiões formais podem assistir às reuniões de uns e outros, os criminosos também o podem fazer sem dó nem piedade.

Chegados aqui, está claro que os países do Hemisfério Norte, os ditos países ricos, e são mesmo ricos, disso ninguém tem dúvidas, não podem e nem devem se contentar em resolver os problemas da pandemia no espaço geográfico das suas fronteiras territoriais apenas. É justo que os países ricos resolvam primeiro os seus problemas. Nem os respectivos povos gostariam da piada, se os Estados resolvessem primeiro os problemas dos outros para depois resolverem os seus. Para alguma coisa os cidadãos dos países ricos pagam impostos. E impostos muito altos. Altos mesmo! De todo o modo, em simultâneo, ou logo a seguir, em momento não muito distante, poderiam ir resolvendo os problemas globais, ajudando os outros países menos ricos a enfrentar a pandemia com alguma razoabilidade. E a melhor ajuda não pode ser a de os países ricos fecharem as fronteiras com os países menos ricos de cada vez que aparece uma nova variante. Porque variantes haverá tantas. Das vacinas, podemos ter a certeza de que andaremos envolto em várias doses, a terceira, a quarta, a quinta, umas de reforço, outras de apanha anual, até que a covid vire uma enfermidade corriqueira. Até que deixe de ser pandemia para passar a ser endemia. Mas, o remédio não é fechar as fronteiras a certos países, de cada vez que se descobre uma nova variante, com um novo nome. Acelerar a vacinação e melhorar a regulação dos movimentos pode ser alternativa. O acesso universal às vacinas pode reduzir o risco de novas variantes, bem assim, reduzir os níveis de reinfecção. Não tenho e nem posso ter a pretensão de entrar em detalhes nesta matéria que incumbe aos nossos conceituados médicos, de que a praça, felizmente, se pode orgulhar, quer pela quantidade quer pela qualidade. Por isso, a César o que é de César (Marcos 12; Mateus 22; Lucas 20). De todo o modo, importa recordar, que sobre esta matéria escrevi nesta plataforma, logo no início da pandemia, com o título: A pandemia do coronavírus e os novos estigmas. Discriminação pode não ser boa saída. Estigmatização pode ser uma arma de dois gumes.

Os criadores de gado devem estar a rir-se e a divertir-se ao ler este artigo. E a gostar, é claro. Eles sabem que se o criador de gado bovino não assegura condições para os vizinhos, não olha ao seu redor, serão eles a abrir as portas para os ladrões quando não o sejam eles próprios. Um rico quando come não pode e nem deve limpar os beiços, porque deve deixar que as migalhas caiam para os pobres se refastelarem. De contrário, estará a chamar a cobiça para si, o que não se deseja.

A liberdade de circulação é uma manifestação natural do ser humano. Somos nós como cidadãos do universo que inventamos as regras de fronteiras, de migração e imigração, vistos, prova de recursos para subsistência no país de destino. Para o seu próprio bem, o ser humano inventa as regras – ubi homo ibi societas, ubi societas ibi jus. Em condições normais, não fosse o evoluir das invenções do ser humano, estaríamos ainda na era primitiva, a andar de um lado para o outro à procura de comida. Estaríamos confundidos uns dos outros em rebanhos humanos. 

Na verdade, há, entre cidadãos de outros continentes, africanos que demandam Europa, por vias menos legais, uns chegam vivos, outros morrem pelo tortuoso caminho marítimo, outros ainda, chegam debilitados. Nas Américas, todos demandam a terra prometida – EUA. Exércitos inteiros, até o mais poderoso do mundo, têm tentado impedir o fluxo migratório, em vão. As pessoas vão à busca de pão e água. Ainda que esse pão e água seja produto das sobras dos outros. Vão também à busca de paz, deixando para trás o sofrimento da guerra, da fome e da miséria. Não têm alternativa: ou têm que ir à busca da sobrevivência ou têm que ir à busca da sobrevivência. Não há meio-termo. Estão entre a espada e a espada. Ou morrer lentamente de fome ou morrer rapidamente afogado. Ou ainda, escapar e chegar à terra prometida.

Na nossa Região, a livre circulação de pessoas e bens tem sido um bico-de-obra. Moçambique e África do Sul introduziram a supressão de vistos. Quando era projecto, parecia que haveria muitas perdas ou prejuízos de ambos os lados. Desde que a medida foi tomada, já lá vão largos anos, não tem havido constrangimentos. Há muitos benefícios mútuos. Como não há bela sem senão, resta controlar os indocumentados, que por essa condição, violam as fronteiras, mais de Moçambique para a África do Sul do que o inverso. Resta controlar também a imigração ilegal de cidadãos estrangeiros provenientes de outros países que usam Moçambique como caminho predilecto para chegar à terra do Rand (moeda sul africana).

Fala-se agora da perspectiva de livre circulação dentro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – CPLP. Selou-se, a propósito, um chamado Acordo Sobre a Mobilidade entre os Países Membros da CPLP. Primeiro, nem todos os países membros ratificaram ainda, incluindo o meu. Apenas ratificaram e depositaram os instrumentos de ratificação: Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Portugal. Segundo, parece que não se trata de um acordo amplo e imediato com a isenção de vistos. É a filosofia de tudo é proibido até que seja permitido. E não de tudo é permitido até que seja proibido. O Acordo visa a criação da base legal sobre a qual se constituirá uma maior mobilidade e circulação no espaço CPLP, identificação não exaustiva, das diferentes modalidades de mobilidade. Um objectivo muito abstracto. Para os países que assinaram, ratificaram e depositaram junto ao Secretariado da CPLP os instrumentos de ratificação, entrou em vigor e de imediato, a livre circulação dos titulares de passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço, ou seja, aqueles que já gozavam destas prerrogativas de livre circulação com esses passaportes. Para o resto do povo, ainda não. Parece caso para se dizer como na gíria se sustenta, a montanha pariu um rato. O acordo incide imediatamente sobre o óbvio. Sobre aquilo que não carecia de acordo, pois os países, de uma maneira ou de outra já tinham vários acordos bilaterais nesse sentido. Tratou-se de transformar esses acordos bilaterais em multilaterais. Política é mesmo uma arte de governar!

A questão da livre circulação não emperra apenas na CPLP. Aqui mesmo entre os países da Southern African Development Community – SADC não é efectiva. Há sempre argumentos para inviabilizar esse propósito. E como os argumentos não faltam, nem mesmo os protocolos de livre comércio estão isentos dessas demarches infinitas.

Mas, falar de globalização e falar da livre circulação de pessoas e bens compreende também a liberdade de fixação de residência. De compra de imóveis, de bens móveis, a eliminação da dupla tributação, entre outros. Também há que pensar para as gerações vindouras e num futuro longínquo, a flexibilização da aquisição da nacionalidade. No caso moçambicano, a nacionalidade é regulada pela Constituição da República. E mesmo que fosse regulada por lei avulsa, a matéria seria sempre do quadro constitucional – constituição em sentido material. Aliás, assim foi com a legislação constitucional e legal aprovada na paradisíaca Praia de Tofo. Essa linda Praia que a covid impede que receba turistas para o incremento do turismo, do lazer e do prazer de viver a vida. No ordenamento jurídico português, quanto à cidadania portuguesa, são considerados portugueses todos aqueles que como tal sejam considerados pela lei ou por convenção internacional.[3]Mesmo com esta construção que remete para a lei e para as convenções internacionais, a matéria não deixa de ser de foro constitucional – a constituição em sentido material.

Sei que a questão da nacionalidadeé menos querida, para o debate, pelos meus amigos combatentes da luta de libertação. Tenho a felicidade de os ter. E não são poucos. Desde generais até praças. Para eles, esta matéria é tabu. E têm razão. Sem dúvida. Mas, vejamos a outra face da mesma moeda. A nossa menina de ouro, Maria de Lurdes Mutola, quando foi estudar e treinar para os EUA, foi várias vezes assediada para mudar de nacionalidade. Não aceitou por amor à Pátria. Não muito longe, do ponto de vista temporal, mas se calhar longe para os mais novos, um conceituado treinador de futebol, em pouco tempo conseguiu a nacionalidade moçambicana. Estou a falar de Victor Bondarenko. Esse excelente treinador que nos lembras os nossos melhores momentos de glória. Muitos países do mundo desenvolvem-se graças à imigração. O antepenúltimo Presidente do país mais poderoso do mundo é um afro-americano, descendente de mãe americana e de pai de origem queniana. O Fundador do Movimento de Libertação em Moçambique, o Doutor Eduardo Chivambo Mondlane, teve a sua consorte, nossa querida mamã, a Doutora. Janet Mondlane, uma cidadã moçambicana de origem americana. Seria enfadonho continuar a enumerar mais exemplos. Estes são bastantes. Muitos países do mundo tiram proveito da imigração e outros nem tanto. Os cérebros são os mais procurados. Entre outros, os atletas e os artistas.

De todo o modo, o movimento desenfreado de pessoas de certas zonas do globo para outras tem a ver com a distribuição e aproveitamento da riqueza. Nenhum país terá fartura enquanto outros tiverem fome. A estabilidade do pobre é a garantia do sossego do rico. Ao pobre quando lhe falta tudo pode virar invejoso e não olhar a meios para resolver os seus problemas. Ninguém gosta de ser pobre. E, o pior é o pobre pensar que a sua falta de riqueza deriva da vastidão do estômago do rico.

Em tudo o que refiro, não pretendo ignorar a defesa dos interesses nacionais de cada país, enquanto for necessário protegê-los de forma equilibrada, e, enquanto o mundo for assim (aparentemente, enviesado).

São estes os problemas que a globalização deve ter em conta. São estes os problemas com os quais o mundo deve se preocupar, para, rapidamente, controlar a epidemia. Enquanto cada país olhar apenas para o seu umbigo, enquanto não pensarmos grande sobre o fenómeno da liberdade natural das pessoas, o fenómeno da circulação da riqueza, do conhecimento, de cérebros e dos capitais, de nada valerá estarmos a sonhar com os direitos humanos da terceira ou da quarta geração, quando os da primeira e da segunda estão em atraso de execução. De nada vale ir tanto à lua, ou ir a Marte quando na terra falta tudo. Ou tem tanto para uns e tem nada para os outros. Estaríamos diante de uma manta de retalhos, a esconder a cabeça, com o resto do corpo de fora!

Falar da livre circulação de pessoas e bens num mundo global é falar da defesa do liberalismo. E eu disse, bem, liberalismo e não libertinagem. Tal como a justiça que para a realizarmos temos de ser justos dentro de nós próprios, para a defesa da democracia temos de ser democratas; para sermos defensores da liberdade global, incluindo a de circulação, temos de ser arautos da liberdade em nós mesmos; de contrário, seremos provincianos!

Não pode haver globalização sem a livre circulação de pessoas e bens! E o Homem, além de ser pessoa, é um dos bens mais preciosos da terra ou do mundo global, o qual, por via do conhecimento, resolve e vence, no seu interesse, todos os obstáculos que estão à sua volta!

E que assim seja, hoje, amanhã e para todo o sempre: amém!

PS: Curvo-me, com respeito e veneração, perante as memórias do Conselheiro Luís Filipe Sacramento; do Arquitecto Júlio Eduardo Zamith Carrilho; e do Administrador Aleixo Miguel Patime (combatente da Luta de Libertação Nacional). Curvo-me, igualmente, mesmo à distância, com o mesmo respeito e veneração, para o carismático Arcebispo Desmond Tutu. Que Deus Misericordioso os tenha em Sua Santa Guarda!


[1]Banimento, entretanto, levantado, para a retoma a partir de 3 de Janeiro de 2022.

[2] Professor Catedrático jubilado da Universidade de Coimbra, conceituado jurista e sociólogo. 

[3]Art. 4 da Constituição da República Portuguesa.

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